O Cristão e o casamento civil
O que segue foi adaptado de uma correspondência por e-mail)
É válido casar simplesmente no civil? Ou é necessário casamento religioso para confirmar o civil?
Casamento é uma ordenança da
criação, não uma ordenança de culto (a palavra refere-se a uma forma de
adoração, não sendo necessariamente negativa). Ele difere
fundamentalmente de algo como o batismo e a comunhão.
Ora, batismo e comunhão precisam estar
associados ao culto apropriado. Por essa razão, o batismo e a comunhão
católica não contam. Se bem me recordo, Calvino apontou que uma pessoa
que foi batizada no catolicismo-romano não precisaria ser batizada
novamente. Eu discordo disso. Essa pessoa jamais foi batizada. Um mórmon
ou budista pode lançar um balde de água sobre mim, mas isso não
corresponderá a um batismo cristão. Eu nego que católicos sejam
cristãos; portanto, nego que o batismo católico seja batismo cristão.
Assim, me oponho neste ponto a muitos reformados e demais cristãos.
Também, os reformados até mesmo
registraram em algumas de suas confissões que somente pessoas
devidamente ordenadas poderiam batizar ou servir a santa ceia. Trata-se
de uma grande bobagem. Não existe base bíblica para isso. Antes, a
Bíblia diz que todos os cristãos são sacerdotes em Cristo; já que somos
sacerdotes, e por também não existir qualquer exceção explícita a isso,
até mesmo uma criança ou mulher cristã podem em princípio
servir a ceia, assim como uma criança ou mulher podem ensinar e pregar a
palavra de Deus. A única proibição a elas é autoridade oficial na
igreja. É uma grande diferença. Por questão de ordem na igreja, alguns
indivíduos, mais provavelmente ministros, são designados a batizar e
servir a ceia, mas isso não significa que somente eles podem fazê-lo. É
uma negação direta do sacerdócio de todos os crentes restringir funções sacerdotais
a ministros ordenados ― como se houvesse uma elite entre os crentes,
que é precisamente aquilo a que os reformados dizem se opor.
Casamento é diferente, pois ele não está
associado a qualquer culto. Antes, o que “faz” um casamento é o acordo
entre um homem e uma mulher de constituir esse tipo de relacionamento.
Deus é a única testemunha necessária, sendo ele testemunha de todo
casamento, seja Deus explicitamente considerado ou não. O primeiro
casamento não teve o testemunho de terceiros. Não existia Estado nem
igreja ― a não ser que usemos a palavra “igreja” de forma tão vaga que
Adão e Eva tenham contado como igreja, mas ainda perceberemos uma
diferença, já que não houve culto formal. Assim, Estado e igreja não
podem criar nem destruir um casamento ― o relacionamento não tem relação
necessária com essas coisas, mas é constituído somente entre homem e
mulher. O Estado e a igreja podem apenas reconhecer o acordo entre o
homem e a mulher. A igreja deve ser especialmente cuidadosa com relação a
isso ― ela não tem um poder místico para constituir a união, e por isso
não deve reivindicá-lo.
A implicação é consistente com o que
(espero!) a maior parte das pessoas já sabe. Reconhecemos que casais não
cristãos estão de fato casados, não importando como tenha se dado esse
casamento. Se as duas pessoas dizem que estão casadas, acreditamos que
estão casadas; e poderíamos esperar delas um comportamento de pessoas
casadas, aplicando-se assim todas as proibições contra o adultério, bem
como a liderança masculina, a submissão feminina, e assim por diante. Se
o homem fugisse com outra mulher e se casasse ela, não iríamos encolher
os ombros e dizer “Bem, na verdade ele era solteiro, e por isso não fez
nada de errado”. Não, iríamos dizer que ele já estava casado, e por
isso cometeu adultério e poligamia. Em outras palavras, não importa se
um casal realizou matrimônio por uma igreja, pelo Estado ou mesmo por
uma cerimônia vodu ― se eles concordam que estão casados, eles estão
casados. A cerimônia é apenas uma formalidade acrescentada ao acordo
matrimonial “real”. É claro, a Bíblia registra cerimônias de casamento,
mas como história, e não como um ensino doutrinário que essas cerimônias
seriam necessárias para se fazer um casamento. O que DEUS uniu, não
separe o homem ― o homem não tem poder de fazer nem um, nem outro.
Cristãos consideram o casamento como
especial e espiritual. Eu concordo. Mas isso não justifica a tentação de
transformá-lo em algo que ele não é. Ele não é um sacramento. É um
acordo instituído na criação, não um culto. Reservar algum poder
especial à igreja para “fazer” uma união matrimonial é pensamento
católico. É atitude muito hipócrita protestantes, especialmente os
reformados, discordarem do que estou dizendo aqui.
Para resumir, nenhuma cerimônia humana
que vá além do acordo entre o casal é estritamente necessária. Todavia,
quando vivemos numa sociedade, existem frequentemente cerimônias e
condutas vinculadas a esse acordo matrimonial básico, de modo que ele
pode ser reconhecido nessa sociedade, podendo o casal então agir como
uma unidade conjugal. É por isso que fazemos registro no governo, etc. O
casamento civil é aceitável porque nenhum Estado ou igreja de fato
realizam o casamento.
Imagino que muitos cristãos ficariam
desconfortáveis com o que estou dizendo aqui, mas está tudo baseado em
tradições humanas. Tenha você apenas em mente que essa doutrina não
torna o casamento algo mais livre, mas sim algo mais rigoroso. Estamos
dizendo que Deus exige responsabilidade de todo casamento, não apenas
dos realizados numa igreja. Ele exige que todos os casamentos não
cristãos sejam submetidos a padrões bíblicos, e é claro, essas pessoas
jamais podem viver à altura desse padrão.
No plano pessoal, você deve reservar um
tempo para definir a questão com base na palavra de Deus, e não na
tradição humana, de modo que sua consciência fique alinhada com a
verdade. E assim você será livre para agir de forma confiante e honrada.
Vincent Cheung é autor de trinta livros e centenas de palestras sobre
uma gama de assuntos em teologia, filosofia, apologética e
espiritualidade. Através dos seus livros e palestras, ele está treinando
cristãos para entender, proclamar, defender e praticar a cosmivisão
bíblica como um sistema de pensamento abrangente e coerente, revelado
por Deus na Escritura. Vincent Cheung reside em Boston com sua esposa
Denise.
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